Lei de Portugal
O Direito de Portugal faz parte da mesma família do sistema jurídico continental. Até finais do século XIX, o direito francês foi a sua principal influência. Desde então, o direito alemão tem assumido esse papel.
História
O que viria a ser o direito português tem as suas raízes históricas no direito que vigorava na região do Extremo Ocidente da Europa que viria a tornar-se Portugal. Este incluía o direito consuetudinário dos povos indo-europeus e celtas que originalmente habitavam aquela área (incluindo os Lusitanos e os Galaicos), o direito romano introduzido após a anexação da região pelo Império Romano, o direito germânico introduzido pelos invasores Godos (incluindo os Visigodos e os Suevos) e o direito canónico aplicado após a adoção do Cristianismo e a influência crescente da Igreja. [1]
Após o estabelecimento de Portugal como reino independente em 1143, a evolução histórica do seu direito pode subdividir-se nos seguintes grandes períodos:
- Do início da monarquia até ao reinado de D. Afonso III (séculos XII a XIII) - Uso do direito consuetudinário e foraleiro, com uma forte influência dos direitos romano, germânico e canónico;
- Do reinado de D. Afonso III ao de D. Afonso V (séculos XIII a XV) - Direito não compilado, baseado nos direitos romano-bizantino) e canónico;
- Do reinado de D. Afonso V ao de D. José I (séculos XV a XVIII) - Compilação das leis em ordenações, continuando o direito a ser baseado no direitos romano-bizantino e canónico;
- Do reinado de D. José I ao estabelecimento da Monarquia Constitucional (século XVIII a 1832) - Introdução do direito natural e influência crescente do Liberalismo;
- Monarquia Constitucional e Primeira República (1832 a 1926) - Direito fortemente influenciado pelo Liberalismo e Individualismo, com a codificação das leis;
- Segunda República / Estado Novo (1926 a 1974) - Direito fortemente influenciado pelo Corporativismo;
- Terceira República (desde 1974) - Direito influenciado pelo Socialismo, mais tarde passando a sofrer a influência crescente do Neoliberalismo e do direito comunitário.[1]
Ordenações
Antes da aprovação do primeiro Código Civil em 1867, Portugal tinha um antigo sistema jurídico baseado no direito romano. A legislação portuguesa foi compilada em três grandes códigos ou ordenações:
- Código Afonsino ou Ordenações Afonsinas, 1446 (formalmente em 1454 por Pedro, Duque de Coimbra);
- Código Manuelino ou Ordenações Manuelinas, 1512-1520 (por Manuel I; modificado em 1526, 1533 e 1580);
- Código Filipino ou Ordenações Filipinas, 1603.[1]
Legislação
As principais leis incluem a Constituição (1976), o Código Civil (1966) e o Código Penal (1982). Outras leis relevantes são o Código Comercial (1888), o Código de Processo civil (1961), o Código de Processo Penal e o Código do Trabalho. O Código Administrativo perdeu a maioria da importância que tinha no passado. Todas estas leis têm sofrido revisões desde a sua publicação original.
Hierarquia das leis
Em todos os Estados, as leis apresentam uma hierarquia (uma ordem de importância), na qual as de menor grau devem obedecer às de maior grau. Eis a hierarquia das leis em Portugal:
- Lei Constitucional
- Tratado internacional
- Lei ordinária
- Decreto-Lei
- Decreto regional
- Decreto regulamentar
- Decreto regulamentar regional
- Resolução do Conselho de Ministros
- Portaria
- Despacho
- Postura
Processo legislativo
Em Portugal, o processo legislativo cabe à Assembleia da República ou ao Governo consoante as respectivas matérias de competência legislativa. Os diplomas emanados da Assembleia da República têm a designação de Leis e os diplomas emanados do Governo têm a designação de Decretos-Lei. [2]
O processo legislativo em Portugal é o conjunto de etapas e procedimentos pelos quais as leis são propostas, debatidas, aprovadas e promulgadas. Esse processo envolve tanto o Poder Executivo quanto o Poder Legislativo e é regido pela Constituição Portuguesa e pelo Regimento da Assembleia da República. O Processo Legislativo Parlamentar [3]
Aqui estão os principais passos do atual processo legislativo em Portugal: [3]
- Iniciativa Legislativa: As leis podem ser propostas por diferentes entidades: o governo, os deputados da Assembleia da República, grupos parlamentares, comissões especializadas, entre outras.
- Discussão em Comissão: Após a apresentação da proposta legislativa, ela é enviada para a comissão parlamentar adequada. A comissão analisa detalhadamente o projeto, pode ouvir especialistas e cidadãos interessados, realizar emendas e propor alterações.
- Debate em Plenário: Depois de passar pela comissão, o projeto é discutido em plenário, ou seja, em sessões abertas da Assembleia da República. Durante o debate, os deputados podem apresentar emendas, discutir os pontos da proposta e votar sobre cada um deles.
- Votação: A votação é a etapa em que os deputados expressam sua opinião sobre a proposta legislativa. As votações podem ocorrer em diferentes momentos, dependendo da complexidade do projeto. A aprovação exige maioria simples dos votos.
- Promulgação e Publicação: Após a aprovação pela Assembleia da República, a lei é enviada ao Presidente da República para promulgação. O Presidente pode promulgar a lei, vetá-la ou enviar para o Tribunal Constitucional se houver dúvidas sobre sua constitucionalidade. Após a promulgação, a lei é publicada no Diário da República e entra em vigor.
- Processo de Fiscalização: Caso haja dúvidas sobre a constitucionalidade de uma lei, qualquer cidadão, o Presidente da República ou um quinto dos deputados pode submeter a lei ao Tribunal Constitucional para avaliação.
- Regulamentação: Algumas leis exigem regulamentação para definir os detalhes de sua implementação. Isso é feito pelo governo através de decretos ou regulamentos, que especificam como a lei será aplicada na prática. [3]
Vale ressaltar que a participação pública é uma parte essencial do processo legislativo em Portugal. Através de audiências públicas, consultas e petições, os cidadãos têm a oportunidade de contribuir com o debate sobre as propostas legislativas, garantindo uma maior transparência e representatividade no processo. [3]
- Processo de Formação das Leis da Assembleia da República
Este processo inicia-se com o projecto de lei (texto apresentado pelos Deputados ou pelos Grupos Parlamentares à Assembleia da República para que esta se pronuncie) ou com a proposta de lei (texto apresentado pelo Governo à Assembleia da República para que esta se pronuncie), depois de aprovado pela Assembleia da República, designa-se por Decreto e, só após promulgação pelo Presidente da República, é publicado como Lei. O texto de uma lei pode ainda ser apresentado por um grupo de cidadãos eleitores.
A promulgação é um ato pelo qual o Presidente da República atesta solenemente a existência de norma jurídica e intima à sua observação. O Presidente da República poderá não promulgar o diploma e exercer o direito de veto, que poderá ser jurídico ou político. A promulgação é uma etapa essencial no decorrer do processo legislativo, pois, só após esta, o texto torna a designação de Lei e a falta de promulgação tem como consequência a Inexistência Jurídica do Ato.
Após a promulgação, o diploma é enviado ao Governo para referenda ministerial, seguindo-se a publicação no Diário da República sob a forma de Lei, para a sua entrada em vigor.[4]
- Processo de Formação dos decretos-lei pelo Governo
Nas suas competências legislativas pode optar por uma de duas situações:
- Assinaturas sucessivas: O texto do diploma é submetido separadamente à assinatura do Primeiro-Ministro e de cada um dos ministros competentes. Uma vez obtidas as assinaturas, o diploma é enviado ao Presidente da República para promulgação.
- Aprovação em Conselho de Ministros: O texto do respetivo Decreto-Lei é apresentado e aprovado em Conselho de Ministros, sendo depois enviado ao Presidente da República para promulgação.
Em caso de veto, o Governo pode:
- arquivar;
- alterar;
- enviar para a Assembleia da República sob a forma de Proposta de Lei.
Vigência e revogação
Em Portugal, a obrigatoriedade da lei surge a partir da sua publicação no Diário da República, mas a sua vigência não se inicia no dia da publicação. O intervalo entre a data de sua publicação e sua entrada em vigor chama-se vacatio legis. Este intervalo pode ser definido pelo legislador, podendo ir entre 1 dia a 1 ano, ou, caso o legislador não especifique a data em que deve entrar em vigor, é aplicado o tempo supletivo, que são 5 dias. Em Portugal, as leis podem ser revogadas:
- por caducidade: a caducidade pode resultar de uma claúsula, contida na própria lei, de que esta se manterá em vigor durante determinado período de tempo ou enquanto durar determinada situação, e pode ainda resultar do desaparecimento das causas de aplicação da lei.
- por revogação: a revogação resulta de uma nova manifestação de vontade do legislador, contrária à anterior. A revogação pode ser:
- parcial: quando só algumas disposições da lei anterior são revogadas pela lei nova;
- total: quando todas as disposições de uma lei são atingidas, por exemplo, por modificação;
- expressa: quando a nova lei declara que revoga uma determinada lei antiga;
- tácita: quando resulta da incompatibilidade entre normas jurídicas da lei nova e da lei antiga.
Aplicação e influência do direito português
A lei portuguesa foi aplicada nos antigos territórios ultramarinos de Portugal, e continuam a ser a principal influência para esses países e territórios. São eles: Angola, Cabo Verde, Goa (integrada na Índia), Guiné-Bissau, Macau (integrada na República Popular da China), Moçambique, São Tomé e Príncipe e Timor-Leste. Em menor escala que nos casos anteriores, a lei portuguesa também mantém alguma influência sobre a lei do Brasil. [5] [6] [7]
A influência do direito português nas ex-colônias e em outras nações que tiveram contato com Portugal é significativa e abrange várias áreas do sistema jurídico, da organização política e das tradições legais. Isso ocorreu devido ao longo período de colonização, exploração e interação entre Portugal e suas ex-colônias, bem como ao papel de Portugal como pioneiro na exploração e expansão global. Muitas ex-colônias de Portugal herdaram parte do sistema legal português. Isso pode incluir elementos do Código Civil, procedimentos judiciais e conceitos legais que foram introduzidos durante a colonização. Muitas ex-colônias adotaram estruturas legais de propriedade e posse de terras que refletem as influências portuguesas. As Ordenações Filipinas, por exemplo, tiveram um impacto duradouro na regulamentação da propriedade e nos direitos de terra em várias nações. [8] [7]
Os sistemas judiciais de várias ex-colônias foram modelados em parte após o sistema judiciário português. As hierarquias e estruturas de tribunais muitas vezes refletem essas influências. Devido ao papel de Portugal como uma nação marítima e comercial durante a Era dos Descobrimentos, muitas nações influenciadas pelo império português incorporaram elementos do direito comercial e marítimo que foram desenvolvidos pelos navegadores e comerciantes portugueses. A Igreja Católica teve uma forte influência em Portugal e suas colônias. Elementos do direito canônico e eclesiástico foram incorporados às tradições legais de muitas nações que tiveram contato com o catolicismo por meio da colonização portuguesa. As Ordenações Filipinas e as reformas pombalinas tiveram influência direta nas ex-colônias, servindo como base para a legislação e regulamentação em diversas áreas. A cultura jurídica, os princípios legais e as tradições judiciais de Portugal também foram transferidos para suas colônias. Isso influenciou a maneira como as sociedades coloniais se organizaram legalmente e como as questões legais eram tratadas. [9] [7]
As nações influenciadas pelo direito português incluem não apenas as ex-colônias do império português, como Brasil, Angola, Moçambique, Cabo Verde, Guiné-Bissau, São Tomé e Príncipe, Timor-Leste e outros, mas também nações que tiveram contato comercial, cultural e diplomático com Portugal ao longo dos séculos. É importante observar que, embora a influência do direito português seja evidente, muitas nações também desenvolveram suas próprias tradições jurídicas e adaptaram as influências portuguesas às suas realidades culturais, políticas e sociais. [9] [7]
Referências
- ↑ a b c Ernesto Fernandes e Anibal Rêgo, História do Direito Português (Súmula das lições proferidas pelo Prof. Marcelo Caetano), Lisboa, 1941
- ↑ «O Processo Legislativo Parlamentar» (PDF). Consultado em 25 de agosto de 2023
- ↑ a b c d «A prática legislativa portuguesa» (PDF). Consultado em 25 de agosto de 2023
- ↑ Artigo 119 da Constituição da República Portuguesa.
- ↑ «Guerra Ultramar e a descolonização da África». Brasil Escola. Consultado em 25 de agosto de 2023
- ↑ «O debate político em torno do problema colonial (1951-1975)» (PDF). Consultado em 25 de agosto de 2023
- ↑ a b c d COSTA, Mário. Juílio de Almeida. História do direito português. Imprenta: Coimbra, Almedina, 2007. ISBN: 9724009483
- ↑ «Direito Português E Brasileiro: História E Evolução.». www.boletimjuridico.com.br. Consultado em 25 de agosto de 2023
- ↑ a b Silva, Nuno J. Espinosa Gomes da (2006). «História do Direito Português: fontes de direito». Consultado em 25 de agosto de 2023